21/10 - Cairns





O quarto aqui em Cairns deixaria o companheiro Lula extasiado com sua cela. Um containerzinho de uns dois metros e meio de largura, com um beliche, uma mesinha sem cadeiras, um condicionador de ar mais barulhento do que o peristaltismo encefálico da camarada Dilma quando se põe a pensar, e uns dois pernilongos. Banheiro coletivo, café da manhã superbosta e aquele estilo meio podrão de albergue de segunda linha. Mas pelo menos tem potões de litro de bloqueador solar espalhados pelo lugar, pra neguinho se besuntar sem dó nem piedade. É o que tenho feito também, com aquela melecância que meu traço autista tolera tão mal, sentindo-me lubrificado como um ânus prestes a ser penetrado pelo suplício de existir, em forma de raios solares. Agora, depois do banho, sinto-me novamente um ser humano digno de ser tocado, não portador daquela oleosidade leprosa, mas amanhã começa tudo de novo.





O passeio de hoje, no qual morreram uns 140 dólares, em detrimento de ir mergulhar no grande recife de coral, ou de uma volta de teleférico gigante pra uma tribo de aborígenes turísticos, foi ir fazer um rafting beeeem meia-boca. Um guia bem divertido, mas, com o rio em nível muito baixo, o ritmo e a emoção da descida foram maia do que homeopáticos. Pau no cu de São Pedro. Em nosso bote, dois casais de americanos, militares, gente boa e agradável em vários aspectos, mas que, provocados por nosso guia, um inglês, começaram a elogiar enfaticamente Donald Trump, o que o provavelmente o guia, e certamente eu, não esperávamos. Me faz pensar como é doida e biodiversa a fauna humana, e como, vivendo na Bolsolândia, nossa Trumplândia tropical, a gente tem que reconhecer a legítima existência de gente que genuinamente pensa assim. E aí, ou pega nas armas ou tem ainda mais um motivo, como se já não fossem tantos, para torcer pelo câncer. Minha amiga de codinome Camarada Pituquinha, que não é petista porque o PT é um partido de direita, acredita na viabilidade das armas. Eu, mesmo muito antes de Bolsonaro, sempre fui mais o câncer.




Maratona não rolou, porque eu fui muito anta, mas nada me impede de pelo menos correr pelas cidades daqui. Então, hoje, ao cair do sol, fui consagrar Cairns com a borracha da sola de meu pisante. Corridinha de hora e meia, chuvinha fraca batendo no rosto, Thomas Dolby selecionado no randômico de meu sonzinho. E me sentindo ensopado de suor finalmente por uma boa causa. 

Comentários

  1. Cadê fotos do rio meia-boca?
    Pq vc insiste em ficar em albergue?
    Cd fotos da penitente q te acompanha por certamente acreditar q assim queimará todo o carma de mil existências?...

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